Confira na íntegra a matéria escrita pelo defensor público e associado da ADPERJ Cléber Francisco Alves, no jornal Consultor Jurídico em 30 de junho de 2020, sobre os 50 anos da Carta de Petrópolis (https://www.conjur.com.br/2020-jun-30/tribuna-defensoria-50-anos-importancia-carta-petropolis-defensoria) Os 50 anos da “carta de Petrópolis” e sua importância para a Defensoria Pública Os últimos dias do mês de junho de 1970 — há exatos 50 anos — foram marcados pela euforia e contentamento do povo brasileiro pela conquista do tricampeonato mundial de futebol, no México, o que se deu no domingo, dia 21. Mas, paralelamente às comemorações pela Copa do Mundo, na cidade serrana fluminense de Petrópolis, entre os dias 28 e 30 de junho de 1970 ocorria um evento que não costuma ser muito lembrado, embora tenha sido de grande importância na definição dos futuros rumos dos serviços estatais de assistência judiciária, serviços esses que foram o embrião da Defensoria Pública brasileira, conforme veio a ser prevista na Constituição de 19881. Esse evento foi o “I Encontro de Procuradores-Gerais de Justiça do Brasil”, organizado pela PGJ do antigo Estado do Rio de Janeiro, e que contou inclusive com a presença do Procurador Geral da República da época. Mas, o leitor poderá perguntar: o que um congresso de chefes do Ministério Público pode ter tido de relevante para a Defensoria Pública? Para melhor contextualizar, é preciso ter presente que, ao longo das décadas de 60 e 70 do século passado, não havia uma definição clara — no Brasil — sobre como deveriam ser organizados os serviços estatais de assistência judiciária àqueles que não podiam arcar com as despesas de contratação de um advogado. A Lei Federal 1060, de 05/02/1950, que tratava da Gratuidade de Justiça e da Assistência Judiciária, não explicitava o modelo que deveria ser adotado para a prestação desses serviços. Por isso, havia grande diversidade — entre os Estados — quanto ao modo de organização respectiva2. É fato notório que o modelo que acabou prevalecendo no Brasil, ou seja, o que foi escolhido pela Assembléia Nacional Constituinte e veio a ser o adotado na Carta de 1988, corresponde — nas suas linhas mestras — àquele que surgira e se desenvolvera, originariamente, no antigo Estado do Rio de Janeiro. Tal modelo, após a fusão do Estado do Rio com o Estado da Guanabara, em 1975, houvera sido consagrado, pioneiramente, no texto da Constituição do novo Estado3, em que se sacramentou o status da Assistência Judiciária como “órgão de Estado”, cujas funções deveriam ser exercidas por Defensores Públicos, e cujo regime jurídico funcional era mais ou menos simétrico ao dos integrantes da carreira do Ministério Público. Esse modelo, estabelecido como paradigmático na Lei Fundamental de 1988, vem sendo paulatinamente explicitado pelo Poder Constituinte Derivado e pelo Poder Legislativo assim como pelos Tribunais pátrios, notadamente pelo STF, no seu papel de intérprete e guardião da Constituição Federal. Pois bem, mas voltando à questão do evento de 1970, na cidade de Petrópolis: por que cabe reconhecer sua importância, nessa trajetória que resultou na constitucionalização da Defensoria Pública brasileira? Como mencionado acima, ao longo dos anos 60, 70 e até mesmo 80 do século XX, intensos debates foram travados acerca de como deveriam se estruturar os serviços de Assistência Judiciária. Um espaço privilegiado para esses debates foram os congressos das carreiras e profissões jurídicas realizados naquela época4. Particularmente, merecem destaque os congressos realizados exatamente no antigo Estado do Rio (antes da fusão com a Guanabara), no âmbito do Ministério Público, tanto pela associação de classe, quanto pela própria Procuradoria Geral de Justiça. E, relembre-se, no caso do antigo Estado do Rio, é preciso estar atento que – no período dos anos 60 e 70 – quando se fala em Procuradoria Geral de Justiça, isso abrange as duas carreiras paralelas e distintas que tinham, ambas, na PGJ seu órgão administrativo unificado5: os profissionais que desempenhavam as funções de Ministério Público e aqueles que atuavam nas funções de Assistência Judiciária; por esse motivo, a associação de classe — embora denominada “Associação do Ministério Público Fluminense” — tinha dentre seus associados tanto os promotores de Justiça quanto os defensores públicos. Tendo presente o contexto acima explicitado, é fato que os congressos fluminenses do Ministério Público tiveram grande importância não apenas para o debate e consolidação das idéias acerca da configuração futura que deveria ser assumida pelo Parquet nacional, mas também para lançar as bases do modelo de serviços estatais de Assistência Judiciária que viria a ser constitucionalizado no país. O primeiro desses congressos ocorreu em novembro de 1967, na cidade de Miguel Pereira, igualmente na região serrana do Rio de Janeiro. O segundo e o terceiro congressos foram realizados em Teresópolis, respectivamente em 1968 e 1970. Embora nominalmente se tratassem de congressos estaduais, era expressiva a participação de delegações de várias outras unidades federativas. A cidade de Nova Friburgo, também na serra fluminense, foi a sede dos quarto e quinto congressos, respectivamente em 1972 e 1973. Uma parte importante da programação desses congressos era o concurso de teses, que contava com a participação de grandes nomes do mundo jurídico de então. No congresso de 1973, por exemplo, em Nova Friburgo, uma das teses aprovadas era de autoria do então promotor de Justiça de São Paulo: Damásio Evangelista de Jesus. Nesse encontro, que foi o último congresso do Ministério Público do antigo Estado do Rio, foi também aprovada a tese “Assistência Judiciária: sua gênese, sua história e a função protetiva do Estado”, que viria a resultar no clássico livro de Humberto Peña de Moraes e José Fontenelle Teixeira da Silva6; o entusiástico apoio à referida tese deu ensejo à aprovação da “Moção de Nova Friburgo”, que foi endereçada ao então Ministro da Justiça Alfredo Buzaid, recomendando-se a elaboração de lei federal que incorporasse as idéias propostas pelos autores. Essa moção foi subscrita pelos chefes de delegações do Ministério Público de nada menos do que 15 Estados, que foram os que se fizeram presentes naquele conclave. Mas, e quanto ao evento realizado em Petrópolis, em 1970? Tratou-se, mais propriamente, de um “Encontro”, e não um
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